O terror do bullying e o imperativolegal: diretores que ignoram a Lei do Bullying não estão imunes


Um incidente perturbador, envolvendo uma criança de 6 anos, colocou em evidência a crucial responsabilidade dos educadores em tomar medidas preventivas e corretivas contra o bullying, tal como previsto pela Lei 13.185/2015. A criança, que sofreu agressões físicas e verbais de caráter racista em uma escola de São Paulo, teve seus relatos desconsiderados pelo diretor escolar, resultando na remoção do mesmo de seu cargo.

A pequena aluna encontrava-se com lesões em sua virilha, olhos e quadril, além de ter sido alvo de comentários depreciativos como “urubu” e “cabelo feio”. A mãe da menina, após notar os sinais de violência, recorreu à escola, que infelizmente, optou por não dar o tratamento adequado ao incidente.

A resposta inadequada da escola – o diretor questionou se as lesões não teriam ocorrido em casa e expôs a menina ao fazer com que ela apontasse seus agressores perante a sala – apenas agravou o trauma da situação. Após uma investigação pela Secretaria da Educação de São Paulo, o diretor perdeu seu cargo e a menina foi transferida para uma nova escola.

A escola tem o dever de aplicar a Lei do Bullying, sob pena do diretor responder nos termos do artigo 13 do Código Penal.

Em um estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), descobriu-se que 40% dos adolescentes entrevistados afirmaram ter sido vítimas de bullying. Nesse contexto, é imperativo que pais e educadores estejam preparados para agir corretamente. Quando suspeita de violência escolar, a família deve primeiramente comunicar a escola e buscar auxílio para resolver a situação.

O bullying afeta não só a vítima, mas também o agressor, muitas vezes sinalizando problemas emocionais, psicológicos, negligência familiar e uma chamada para ajuda. É essencial que tanto a família quanto a instituição escolar tratem o incidente com seriedade, oferecendo suporte adequado.

As escolas, por sua vez, devem atuar proativamente na prevenção do bullying, sob pena de responsabilidade criminal dos seus diretores. Levando em consideração a Lei 13.185/2015 (lei do bullying), o artigo 13 do Código Penal poderia ser interpretado da seguinte maneira, de forma simplificada:

Se um ato de bullying ocorre em uma escola e essa ocorrência resulta em um crime, a responsabilidade por esse crime pode recair sobre a pessoa que tinha a obrigação de preveni-lo. Nesse caso, essa pessoa seria o diretor da escola, que é obrigado por lei (Lei 13.185/2015) a prevenir e combater atos de bullying na instituição que dirige.

Se os danos sofridos pela vítima não estão relacionados ao bullying escolar, então o diretor da escola não é responsável. Porém, se a falta de prevenção ou combate ao bullying contribuiu para o crime, o diretor pode ser considerado responsável. Por essa razão é tão importante fazer o registro público do programa de combate ao bullying e dos atos de prevenção e implementação de políticas de cultura de paz, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

Ainda é importante esclarecer que, se o diretor da escola deveria e poderia ter feito algo para prevenir o crime (como implementar medidas de prevenção ao bullying conforme exige a Lei 13.185/2015), e nada fez, ele pode ser responsabilizado pelo crime. Isso vale especialmente se:

a) Por lei (no caso, a Lei 13.185/2015), o diretor da escola tem a responsabilidade de proteger os alunos contra o bullying;

b) De alguma forma, ele assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;

c) Com a falta de medidas preventivas ou ações contra o bullying, ele criou ou aceitou o risco do crime acontecer.

Com base na situação de bullying na escola e a subsequente negligência do diretor, a vítima e sua família têm o direito de buscar compensação pelos danos materiais e morais sofridos. Este pedido de compensação, também conhecido como responsabilidade civil, pode ser feito contra a escola e o diretor simultaneamente. A justificativa para isso está em vários artigos do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil.

O Artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor protege os clientes – neste caso, os alunos e suas famílias – contra serviços defeituosos. A educação é considerada um serviço, e se a escola não conseguiu garantir um ambiente seguro para o aluno, o serviço é considerado defeituoso.

O Artigo 186 do Código Civil estabelece que quem causar dano a outra pessoa, seja por ação ou omissão, deve reparar o dano. Assim, tanto a escola como o diretor podem ser responsabilizados por não terem agido para prevenir ou tratar o bullying.

Por sua vez, os artigos 933 e 932, IV do Código Civil estabelecem que uma pessoa ou entidade poderá ser responsabilizada pelos atos das pessoas sob sua autoridade. Isso significa que o diretor, e a escola como entidade, podem ser responsabilizados pelos atos de bullying cometidos por seus alunos.

Em resumo, a vítima de bullying pode buscar compensação pela dor e sofrimento dentro da área criminal e civil, pelos danos materiais e morais causados pela negligência da escola e do diretor em lidar com o bullying. É importante que toda a escola brasileira busque aconselhamento jurídico para garantir que todas as ações apropriadas sejam tomadas pela instituição de ensino para que possam evitar prejuízos milionários, sem prejuízo do abalo na reputação da escola que não aplica a lei do bullying de forma correta.

Ana Paula Siqueira, sócia do Siqueira Lazzareschi de Mesquita Advogados, mestre em Direito Civil, professora universitária e diretora da ClassNet Consultoria

Extraído do site:
https://www.estadao.com.br/politica/blog-do-fausto-macedo/o-terror-do-bullying-e-o-imperativo-legal-diretores-que-ignoram-a-lei-do-bullying-nao-estao-imunes/